Em meio a paisagens urbanas, nos esquecemos do tempo da natureza. Mas em algum lugar do interior de São Paulo, uma testemunha silenciosa nos lembra que a história do Brasil vai muito além do ano de 1500. Se a árvore viva mais antiga do mundo, um pinheiro da Califórnia apelidado de Matusalém, tem quase 5 mil anos, o Brasil tem seu próprio patriarca, uma árvore que, com seus 600 anos estimados, já estava aqui muito antes de o país receber esse nome.
Celebrando o Dia da Árvore, que no Brasil é comemorado anualmente em 21 de setembro, vamos mergulhar na história do exemplar mais antigo em território nacional. Prepare-se para conhecer o Patriarca, um gigante de seis séculos, sua localização e o método científico que revelou sua idade impressionante. Esta é uma história sobre a resiliência da natureza, a importância da conservação e a ciência que nos ajuda a decifrar o passado.
Qual é a Árvore Mais Antiga do Brasil?

De acordo com uma pesquisa detalhada conduzida pelo renomado engenheiro agrônomo e professor da USP, Mário Tomazello Filho, a árvore mais antiga do Brasil é um majestoso jequitibá-rosa (Cariniana legalis), carinhosamente batizado de “Patriarca”.
Este monumento vivo da natureza está localizado em uma área de conservação no interior paulista: o Parque Estadual de Vassununga, no município de Santa Rita do Passa Quatro. A escolha do nome “Patriarca” reflete sua imponência e o peso histórico que ele carrega. Ele representa não apenas uma espécie, mas um elo direto com um passado distante, quando as matas brasileiras eram intocadas e exuberantes.
A Determinação de uma Idade Centenária: A Dendrocronologia
A busca para descobrir a idade exata de uma árvore como o Patriarca é um verdadeiro desafio científico. Por muito tempo, existiu uma crença popular de que o jequitibá-rosa poderia ter mais de 3 mil anos. No entanto, o estudo mais recente e preciso, liderado pelo professor Mário Tomazello Filho, utilizou uma técnica conhecida como dendrocronologia.
A dendrocronologia é uma ciência que se dedica a datar eventos passados por meio da análise dos anéis de crescimento das árvores. Cada anel no tronco de uma árvore representa um período de crescimento, geralmente um ano, e funciona como uma espécie de impressão digital do clima e das condições ambientais da época. No caso do Patriarca, a pesquisa envolveu a contagem e medição desses anéis para chegar a uma estimativa mais acurada.
O estudo revelou que, embora existissem teorias anteriores, a idade real do jequitibá é de aproximadamente 580 a 600 anos. O gestor do Parque Vassununga, Gabriel Henrique Pereira, comentou em entrevista: “O primeiro levantamento de um pesquisador [o biólogo Manuel de Godoy, na década de 1970] fez uma projeção de que a árvore poderia ter 3.010 anos”, mas destacou que “Já o professor Mário Tomazello Filho, da USP, fez um estudo e estimou que a Patriarca teria em torno de 580 a 600 anos”. A metodologia utilizada pelo pesquisador da USP é a mais aceita pela comunidade científica.
A técnica, no entanto, não é simples. O professor Tomazello Filho explicou que a espécie Cariniana legalis possui anéis de crescimento incompletos, o que pode dificultar a demarcação. Mas ele também afirmou: “As cicatrizes do lenho induzidas pelas marcações cambiais e os resultados dos incrementos em diâmetro do tronco confirmam a formação anual dos anéis de crescimento. Possibilitando a determinação da idade e da taxa de crescimento de árvores de jequitibá-rosa”. Essa abordagem rigorosa e a validação científica trouxeram a idade real à tona, revelando a longevidade impressionante, mesmo que diferente da estimativa inicial.
Uma Visita ao Passado: Conheça o Patriarca
Ver de perto o Patriarca é uma experiência única. Localizado no Parque Estadual de Vassununga, este gigante de aproximadamente 42 metros de altura e 4 metros de diâmetro é uma visão impressionante. Para se ter uma ideia, essa altura equivale a um prédio de 14 andares, e seu diâmetro é tão grande que seriam necessários dez homens para abraçar completamente seu tronco.
O parque, que foi criado em 1970 com o objetivo de preservar importantes remanescentes da Mata Atlântica e do Cerrado, é uma área de transição de ecossistemas e se tornou um santuário para a espécie. Além do Patriarca, o local abriga a “Trilha dos Jequitibás”, onde os visitantes podem caminhar e contemplar a densa concentração de jequitibás-rosa centenários.
Nessa mesma trilha, encontra-se outra joia natural: o “Matriarca”. Com 44 metros de altura, essa árvore é ainda mais alta que o Patriarca, embora não seja a mais antiga do país. Juntos, esses gigantes representam a força e a beleza da flora brasileira e a importância da sua preservação. Eles são a prova viva de que os jequitibás estão entre as árvores mais altas do Brasil, podendo chegar a 60 metros, e uma das espécies mais longevas, resistindo por centenas de anos.
Por Que o Jequitibá-rosa é Tão Especial?
A história do jequitibá-rosa não se resume à sua idade. Ele é um verdadeiro ícone da Mata Atlântica e um dos reis da floresta.
- Longevidade e Resiliência: Sua capacidade de viver por centenas de anos o torna um dos símbolos mais poderosos de longevidade na natureza. Ao longo de sua vida, uma única árvore pode testemunhar e sobreviver a diversas mudanças climáticas, eventos históricos e pressões ambientais, como desmatamento e queimadas.
- Relevância Ecológica: O jequitibá-rosa é uma espécie “clímax”, o que significa que ele prospera em ecossistemas maduros. Sua copa densa e ampla oferece sombra e abrigo para outras plantas e animais, como orquídeas, bromélias, pássaros e mamíferos. Ao longo da história, ele foi essencial para a manutenção da biodiversidade em seu habitat.
- Patrimônio Natural Ameaçado: Apesar de sua imponência, o jequitibá-rosa está classificado como vulnerável, de acordo com a Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais). Sua proteção, como a que ocorre no Parque Estadual de Vassununga, é fundamental para garantir a sobrevivência da espécie.
Em essência, a história do Patriarca não é apenas sobre uma árvore velha. É um convite para refletir sobre nossa própria história, sobre a importância de proteger nosso patrimônio natural e sobre o que podemos aprender com a resiliência silenciosa de um ser vivo que testemunhou séculos de transformações em nossa terra.
Conclusão: Um Gigante que Nos Ensina sobre Tempo e Preservação
A descoberta e o estudo do Patriarca, a árvore mais antiga do Brasil, nos mostram que a natureza guarda segredos impressionantes. Com seus 600 anos de idade, este jequitibá-rosa é um verdadeiro tesouro vivo, uma cápsula do tempo que nos conecta a um Brasil que ainda nem existia. Sua história, longe de ser apenas uma curiosidade, serve como um lembrete poderoso da importância de valorizar e proteger as florestas que nos cercam.
A visita ao Parque Estadual de Vassununga não é apenas um passeio; é uma oportunidade de se reconectar com a história natural do país e de se maravilhar com a majestade de uma árvore que resistiu ao tempo e continua de pé, forte e imponente. A história do Patriarca é um convite à reflexão sobre a necessidade urgente de conservar os remanescentes de Mata Atlântica e de garantir que as futuras gerações também possam testemunhar a grandeza dessas joias da natureza.
Ao valorizarmos árvores como o Patriarca, estamos garantindo que a memória de um passado antigo, gravada nos anéis de seu tronco, continue a nos educar sobre a importância da preservação ambiental e sobre a necessidade de vivermos em harmonia com nosso planeta.





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